Brancos Mortos (bib.), de Bruce Holland Rogers é, à semelhança de Como o Som do Vento nas Árvores, mais uma compilação de pequenas histórias do que propriamente um conto. Aqui são 11, as historietas, e têm pouco ou nada de fantástico. Trata-se de histórias quintessencialmente americanas, de tal forma que não foram poucas as vezes em que senti que havia ali alguma referência cultural que eu não estava a apanhar. Muito por isso, não gostei por aí além desta obra. Terminei a leitura com a sensação de que tinha sido escrita para um leitor americano e só para um leitor americano, não para mim. De que procurava precisamente o contrário da universalidade que tantas vezes se encontra na literatura. Ou em qualquer arte, diga-se de passagem. Mas não posso dizer que me tenha desagradado. Não é isso, até porque basta a habitual competência de Rogers na elaboração dos seus contos para a leitura já valer a pena. Mas ficou-me a faltar qualquer coisa. E é provável que, de todo o livro, seja este o texto de que menos gostei.
Arquivo do dia: 2013-01-30
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Sara está à beira do abismo. Desde que o noivo morreu no dia do casamento que se afundou numa depressão que, com o passar do tempo, apenas se agravou. Sara vê-o em toda a parte, sente-o como uma presença invisível, encontra-o nos seus sonhos. O passado é uma sombra da qual não se consegue libertar. Mas tudo muda quando conhece Martim. Apesar das circunstâncias desastrosas em que se conhecem, basta um primeiro olhar para que ambos sintam que já se conheciam antes, talvez de outro tempo, e que há um sentimento forte à espera de nascer nas suas vidas. Mas Rodrigo permanece presente na vida de Sara e não está disposto a libertá-la, muito menos a vê-la feliz com outro homem. O romance entre ambos não pode acontecer. E ele fará o que for necessário para o impedir.
Em parte romântico e em parte sombrio, este é um livro que, não sendo particularmente elaborado, cativa principalmente pela história envolvente. As sombras na vida de Sara e os elementos sobrenaturais que se vão revelando opõem algo de obscuro à quase leveza com que o afecto vai crescendo entre os protagonistas, o que contribui para que a história se mantenha envolvente. Além disso, o facto de tanto Sara como Martim terem um segredo no passado torna as suas histórias complementares, despertando, ao mesmo tempo, algo de empatia para com eles. Importa ainda acrescentar que, apesar de muito do enredo se centrar nos protagonistas, há alguns elementos aparentemente secundários que, além de cativantes (e, no caso de Mike, enternecedores) acabam por ser muito relevantes para o enredo.
Ainda que haja vários momentos de acção, o ritmo não é propriamente compulsivo. Principalmente no início, a descrição dos sonhos e de algumas características do cenário cria para a evolução do enredo um ritmo relativamente pausado. Para isso contribuem também alguns recuos a acontecimentos passados, que, ao serem apresentados aos poucos, permitem prolongar um pouco o mistério, mas que, não estando bem identificados e uma vez que surgem numa fase inicial da história, quando as personagens ainda não são muito familiares, tornam a leitura um pouco confusa. Esta estranheza inicial desaparece com o maior desenvolvimento da relação entre os protagonistas, levando a que a história cresça em intensidade à medida que novas revelações são apresentadas.
A nível de escrita, há algumas fragilidades a apontar, não muito graves, mas facilmente detectáveis. Há algumas gralhas ao longo do texto, mas não ao ponto de prejudicarem muito o ritmo de leitura. E há alguma confusão no sentido de algumas palavras e no uso de alguns tempos verbais, fazendo com que partes do texto pareçam um pouco mais confusas do que poderiam ser. Não são falhas que surjam com muita frequência, mas, por serem facilmente reconhecíveis, acabam por quebrar um pouco a envolvência do enredo.
De referir, por último, que, ainda que não fiquem grandes pontas soltas no enredo principal (excepção feita ao final, particularmente ambíguo, mas adequado, tendo em conta as circunstâncias do enredo), há algumas questões que ficam sem resposta, principalmente no que diz respeito a uma das presenças sobrenaturais, mas também à sensação de reconhecimento entre Sara e Martim, que nunca é completamente explicada. Não são respostas essenciais ao desenvolvimento do enredo, é certo, mas fica sempre algo de curiosidade e a sensação de que mais poderia ter sido explorado neste aspecto.
Tudo somado, a impressão que fica deste livro é a de uma história relativamente simples, mas com um bom enredo e um interessante toque de mistério. Haveria, talvez, mais a desenvolver nalguns aspectos da história e mais algumas questões que poderiam ter sido esclarecidas. Foi uma leitura agradável, ainda assim, e com um lado sombrio particularmente cativante. Gostei, portanto.
Além de perito em arte, Perfecto Cuadrado é um habilidoso falsário, que viaja pelo mundo desenhando rostos anónimos no metropolitano e coleccionando mulheres belas e sedutoras. É um homem experimentado na arte de seduzir e de amar. Nada faria prever que se apaixonasse de forma eruptiva por uma mulher misteriosa com quem se cruzou no metro de Londres – Josephine K.
Para Perfecto Cuadrado, a vida é uma sucessão de planos, sendo o presente um refluxo do passado, exceptuando dois acontecimentos súbitos: os distúrbios que incendeiam a cidade de Londres e a paixão que arde dentro dele.
A Paixão de K. é uma viagem à insensatez de todas as paixões.
Miguel Miranda é médico e autor de vários romances, livros de contos e livros infantis. Recebeu o Grande Prémio de Conto da APE pelo livro Contos à Moda do Porto (1996); o Prémio Caminho de Literatura Policial pelo livro O Estranho Caso do Cadáver Sorridente (1977); e o Prémio Fialho de Almeida pelo livro A Maldição do Louva-a-Deus (2001). Está traduzido em Itália e representado em diversas colectâneas. A Paixão de K é o seu oitavo romance, depois de Dai-lhes, Senhor, o Eterno Repouso e Todas as Cores do Vento, já publicados pela Porto Editora.
Em 1536 começava a funcionar, em Évora, onde a corte residia, a Inquisição. O seu objectivo principal era defender a fé e a Igreja. A bula papal da fundação explicitava a natureza dos crimes sob a sua alçada. Apelava-se a todos que denunciassem qualquer pessoa suspeita de ter aderido às crenças luteranas, observado cerimónias e costumes judaicos ou islâmicos, negado a existência da vida eterna, acreditado na transmigração das almas até ao dia do Juízo, contestado a virgindade de Nossa Senhora ou que Cristo fosse o Messias prometido no Antigo Testamento, praticado a bigamia, bruxaria ou feitiçaria, possuído livros para celebrar sabats nocturnos ou outros defesos pela Igreja, incluindo bíblias escritas em línguas vernáculas. Iniciava-se uma perseguição que levou milhares de vítimas, homens e mulheres, que pelas suas ideias e comportamentos foram presos, acusadas e, no limite, mortas nas fogueiras por condenação do Santo Ofício.
Nascia, deste modo, no coração do Renascimento, a Inquisição, que marcou de forma vincada a História de Portugal e do seu império durante 285 anos. A sua influência continua-se a sentir ainda hoje, em certas dimensões da vida institucional e até nos costumes e modos de ser e pensar.
Numa pesquisa rigorosa e baseada em consulta exaustiva de arquivos e documentação, Giuseppe Marcocci e José Pedro Paiva apresentam a primeira história da Inquisição portuguesa, desde a sua fundação à extinção, em 1821.
José Pedro Paiva é professor na Universidade de Coimbra, investigador no Centro de História da Sociedade e da Cultura e no Centro de Estudos de História Religiosa. A sua área de pesquisa central é a história religiosa e cultural em Portugal, séculos XVI-XVIII. Entre outros livros é autor de Bruxaria e superstição num país sem "caça às bruxas"(Lisboa, 1997), Os bispos de Portugal e do império (1495-1777) (Coimbra, 2006), Baluartes da fé e da disciplina.
Giuseppe Marcocci é professor de História Moderna na Università degli Studi della Tuscia, em Viterbo (Itália) e coordenador do projeto de investigação Beyond the Holly War, na Scuola Normale Superior, em Pisa (Itália) . A sua área de pesquisa central é a história política, cultural e religiosa do mundo ibérico, com especial atenção sobre o caso português entre os séculos XV e XVIII. Entre outros estudos, é autor de A consciência de um império: Portugal e o seu mundo, sécs. XV a XVII (Coimbra 2012).