The Merchant and the Alchemist's Gate é uma bela noveleta de Ted Chiang que, usando a técnica das narrativas dentro de narrativas e a ambientação das Mil e Uma Noites, conta uma convoluta história sobre viagens no tempo, através de portais, e reflete sobre os conceitos de destino e de livre arbítrio. O tempo que Chiang descreve é um tempo linear, inalterável e não sujeito a paradoxos. Não que qualquer tempo linear e inalterável esteja imune a paradoxos. Mas no universo que Chiang descreve sim. As viagens, que tanto podem realizar-se para o passado como para o futuro, acontecem numa linha temporal única, e a parte mais interessante da história é o modo como Chiang consegue conjugar isso, que em princípio geraria paradoxos do tipo "se eu souber que vou morrer no sítio tal a tais horas bastar-me-á não estar lá a essa hora para alterar o futuro que teoricamente será inalterável", com a conservação da capacidade de decisão individual e do inesperado, através de um conjunto de pequenas — ou não tão pequenas como isso — histórias entrelaçadas, cada uma centrada na sua personagem. O resultado é um perfeito nó — ou um nó perfeito, o que não é bem a mesma coisa — na cabeça e nos conceitos do leitor. Uma ficção científica de baixa tecnologia, muito filosófica, e bastante bem escrita. Muito bom.
Arquivo do dia: 2013-01-28
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Um cadáver encontrado na catedral de Santiago de Compostela e o inesperado desaparecimento de um códice antigo. À primeira vista, nada liga os dois acontecimentos. Mas basta a identidade da morta e algumas descobertas sobre os seus interesses e relações para que o mistério se adense. Patricia Pálmer teria ligações a um pequeno grupo ecológico e um interesse particular por mitos e crenças, com particular destaque para as doutrinas de Prisciliano. Ora este é precisamente o autor do livro desaparecido e, aparentemente, Patricia dedicou bastante tempo a estudar a sua história. As ligações começam a tornar-se evidentes. E, enquanto o comissário Lois Castro segue com a sua investigação, há dois jornalistas - um veterano e uma estagiária - que sentem também interesse pelo caso. Será o conjunto das conclusões de todos suficiente para desvendar o mistério?
Parte do que torna este livro cativante está na forma como a autora consegue conjugar uma série de temas bastante diferentes, apresentando informação relevante sobre todos sem nunca perder de vista a linha essencial do enredo. A base do mistério é a morte de Patricia e é a partir desse ponto que irão surgir todas as ramificações, quer as que têm uma relação directa com o que lhe aconteceu, quer com outras pistas que, partindo de Patricia, se expandem para o desvendar de outros crimes e de outros culpados.
Esta conjugação de diferentes temáticas implica uma boa dose de contextualização, o que leva a que os acontecimentos evoluam a um ritmo bastante pausado. Ainda assim, muita da informação é interessante - sendo de destacar as questões relativas à heresia - e o mistério está sempre presente, o que faz com que, não sendo propriamente de leitura compulsiva, o enredo se mantenha envolvente e intrigante.
A nível de personagens, há um desenvolvimento bastante gradual dos protagonistas, particularmente evidente no passado misterioso - e revelado em pequenas e ocasionais doses de informações - da jovem jornalista. Este mistério e a forma como moldou a sua personalidade são parte do que a torna cativante, já que o seu temperamento peculiar define também as suas relações (ou falta de) com os colegas. Há um fantasma na vida de Laura Márquez e esse fantasma que a torna fechada, torna também mais interessante a sua relação com Villamil. Ainda que o desenvolvimento desta relação seja relativamente discreto, ficando a impressão de que mais poderia ser explorado sobre o assunto.
Envolvente e intrigante, apesar de um ritmo relativamente pausado, este é um livro que, partindo de vários temas interessantes, constrói para as suas personagens um mistério com alguns momentos inesperados, uma evolução cativante e um final que, respondendo a tudo aquilo que é esperado, deixa, ainda assim, algumas possibilidades interessantes em aberto. Uma boa leitura, em suma. Gostei.
Margaret e Patrick estão casados há apenas alguns meses quando decidem partir para o Quénia, convencidos de que irão viver uma grande aventura em África. No entanto, Margaret depressa se apercebe de que não conhece os costumes complexos do seu novo lar e tão pouco o homem que tem ao seu lado.
Quando, certo dia, um casal inglês os convida para escalar o monte Quénia, eles aceitam, entusiasmados, o desafio. Porém, durante a árdua subida, ocorre um terrível acidente e, no rescaldo da tragédia, Margaret ver-se-á enredada numa teia de dúvidas sobre o que se passou realmente na montanha. Estes acontecimentos, que a irão afectar profundamente, terão consequências indeléveis no seu casamento.
Natural do Massachusetts, onde ainda hoje reside, Anita Shreve formou-se na Tufts University, foi professora e acabou por enveredar pelo jornalismo após uma das suas histórias ter ganho o O. Henry Prize, em 1975, escrevendo então artigos para revistas como a Quest, Us e Newsweek. Mais tarde, publicou dois livros de não ficção a partir de artigos publicados na The New York Times Magazine.
Em 1989, abandonou o jornalismo e dedicou-se apenas à literatura, alcançando um grande sucesso internacional – as suas obras venderam já cerca de 8 milhões de exemplares em todo o mundo. Em 1998, recebeu o PEN/L.L. Winship Award e o The New England Book Awardpara ficção.
No catálogo da Porto Editora figuram já os seus romances Testemunho e A Ilha dos Desencontros.
A vida quotidiana em tempos de arbitrariedade e atropelos, com os seus medos e valentias, as suas cedências e heroísmos, abre-se diante do leitor num relato cativante e pleno de humor.
Durante a ditadura uruguaia, o negro Johnny Sosa, um humilde cantor de blues da cidade de Mosquitos, revela um acto de coragem inimaginável para os que julgam conhecê-lo – e que acabará por converter-se num belíssimo canto à dignidade humana.
Mario Delgado Aparaín oferece-nos, numa época de desconcerto, algo mais do que um romance ameno e aprazível: põe-nos em contacto com a condição do homem, complexa e imprevisível.
Mario Delgado Aparaín nasceu em Florida, no Uruguai, em 1949. Escritor, professor e jornalista, é autor de três livros de contos, Las llaves de Francia (1981), Causa de buena muerte (1982) e La leyenda del Fabulosísimo Cappi y otras historias (Alfaguara, 1999); e de cinco romances, Estado de gracia (1983), El día del cometa (1985), La balada de Johnny Sosa (1987), Por mandato de madre (Alfaguara, 1996) e Alívio de luto (Alfaguara, 1998). O livro A Balada de Johnny Sosa ganhou o Prémio de Literatura de Montevideu em 1988. Foi publicado em Espanha e traduzido no Brasil, Holanda, França, Itália, Alemanha, Portugal e Grécia.